Iracema

O texto é muito breve, com cerca de 80 páginas nas edições mais recentes. No entanto, seu enredo é repleto de aventuras e peripécias, bem ao gosto do Romantismo, escola literária da qual Alencar é um dos maiores expoentes no Brasil. A história se inicia com o guerreiro branco Martim Soares Moreno, amigo dos índios pitiguaras, que habitavam o litoral, perdendo-se nas matas. Lá foi encontrado por Iracema, a deslumbrante virgem, filha do pajé Araquém, da tribo dos tabajaras, habitantes do interior da região.

 

Iracema acolheu o jovem branco e o levou para sua tribo, onde ele foi recebido como hóspede e amigo. Ao inteirar-se da celebração que os tabajaras faziam a seu grande chefe Irapuã, que vai comandá-los num combate aos pitiguaras, Martim resolveu fugir, naquela mesma noite. Iracema o impediu, pedindo-lhe que aguardasse a volta de seu irmão Caubi, que poderia guiá-lo pelas matas.

Aos poucos, surge afeto entre Iracema e Martim, que logo se transforma em paixão. A situação se complica, pois Irapuã também estava apaixonado pela índia e tentou matar Martim quando este já deixava a aldeia, após descobrir que Iracema, por ser filha do pajé e guardiã do segredo da jurema, deve permanecer solteira.

No entanto, a união dos dois se consuma numa noite em que Martim, em sonho, imaginou possuir Iracema, sendo que esta de fato se entregou a ele. Desse modo, quando Martim decide partir para escapar a Irapuã e aos tabajaras, Iracema lhe revelou a verdade e se dispôs a segui-lo. Os dois partiram ao encontro de Poti, chefe dos pitiguaras, que considerava Martim seu irmão. Foram seguidos por Irapuã e os tabajaras, o que resulta no conflito entre as duas tribos adversárias.

Mesmo sofrendo pela derrota de seu povo e pela morte de muitos dos seus, Iracema segue Martim e passa a viver com ele na tribo de Poti. Com o passar do tempo, porém, Martim se mostra desinteressado pela esposa, parece sentir saudades da civilização de onde veio, mas sabe que não pode ir para lá e levar Iracema com ele. Nesse ínterim, o guerreiro branco - que adotou o nome indígena de Coatiabo - enfrenta diversos combates, enquanto Iracema engravida de um filho seu. Ainda assim, a índia sofre as constantes ausências do marido e definha de tristeza.

Ao voltar de uma batalha, Martim encontra Iracema com seu filho - a quem ela chamou Moacir, que significa "o filho do sofrimento". A índia está extremamente debilitada. Só teve forças para entregar o filho ao pai e pedir-lhe que a enterrasse aos pés de um coqueiro de que ela tanto gostava. O lugar onde Iracema foi enterrada passou a se chamar Ceará - segundo a tradição, Ceará significa canto da jandaia, a ave de estimação de Iracema.

Sofrendo a perda de Iracema, Martim retorna a sua pátria com o filho. Quatro anos depois, volta novamente ao Brasil, onde ajuda a implantar a fé cristã, convertendo Poti, que recebeu o nome de Felipe Camarão. Os dois ajudaram o comandante Jerônimo de Albuquerque na luta contra os holandeses. Quando podia, Martim ia ao local onde Iracema estava enterrada e se deixava consumir pela saudade.

O simbolismo da narrativa de Alencar é evidente: do cruzamento das duas raças - o europeu e o índio - nasce o brasileiro. Nesse sentido, a obra é uma expressão do Indianismo que caracterizou a primeira fase do Romantismo no Brasil. O país - cuja independência completava 43 anos à publicação de Iracema (1865) - precisava valorizar suas raízes e sua história, para afirmar-se como nação livre e soberana. 

 

         A Obra                 O Autor         

 

 

 Comentando...

Um dos mais belos romances da nossa literatura romântica, Iracema é considerado por muitos “um poema em prosa”. A trágica história da bela índia apaixonada pelo guerreiro branco é contada por José de Alencar com o ritmo e a força de imagens próprios da poesia.
Em Iracema, José de Alencar construiu uma alegoria perfeita do processo de colonização do Brasil e de toda a América pelos invasores portugueses e europeus em geral. O nome Iracema é uma anagrama da palavra América. O nome de seu amado Martim remete ao deus greco-romano Marte, o deus da guerra e da destruição.
O autor demonstra, já a partir do título, um evidente trabalho de construção de uma linguagem e de um estilo que possam melhor representar, para o leitor, “a singeleza primitiva da língua bárbara”, com “termos e frases que pareçam naturais na boca do selvagem”.
O livro foi publicado em 1865 e, em pouco tempo, agradou tanto aos leitores quanto aos críticos literários, a começar pelo jovem Machado de Assis, então com 27 anos, que escreveu sobre Iracema no Diário do Rio de Janeiro, em 1866:
“Tal é o livro do Sr. José de Alencar, fruto do estudo e da meditação, escrito com sentimento e consciência… Há de viver este livro, tem em si as forças que resistem ao tempo, e dão plena fiança do futuro…Espera-se dele outros poemas em prosa. Poema lhe chamamos a este, sem curar de saber se é antes uma lenda, se um romance: o futuro chamar-lhe-á obra-prima.”