Análise da Obra

 

Foco Narrativo

  • Narrativa em 3ª pessoa, na maior parte do tempo: narrador-observador:
  • Esse narrador não é neutro e nem um mero observador. É fácil perceber sua admiração pela natureza e pelos portugueses, basta atentar para adjetivação usada por ele;
  • O narrador tanto se envolve com a história contada que a narrativa em 3ª pessoa, algumas vezes, descamba para a 1ª. “O sentimento que ele pôs nos olhos e no rosto, não o sei eu”.
  • É um narrador que conta a história, primeiro, sob o ponto de vista dos sentimentos do índio e, até por isso, a obra se chama Iracema. Mas, é evidente que esse ponto de vista não será levado até o fim, até porque Iracema aproxima-se de forma determinante das heroínas românticas: mulheres passivas.

A Estrutura Narrativa

  • A narrativa estrutura-se em flashback;
  • O 1º capítulo narra a partida de Martim, Moacir e do cachorrinho Japi na jangada que irá até o navio que os levará a Portugal. Iracema já está morta;
  • O 32º capítulo narra a morte de Iracema e o 33º, o retorno de Martim Moreno para fundar o Ceará;
  • Personagens históricos, como Martim Moreno – primeiro fundador do Ceará – e Poti – chefe guerreiro dos Potiguaras – mesclam-se a personagens criados pela imaginação do autor, como Iracema, Moacir, Caubi, Araquém, pois não há registro de suas existências;
  • Fatos reais (a luta entre tabajaras e potiguaras, entre franceses e portugueses) mesclam-se a fatos imaginados pelo autor, como o romance entre o guerreiro português e a índia, sacerdotisa tabajara;
  • O lírico, o épico e o maravilhoso entremeiam-se no mesmo espaço, como convém a uma lenda.

 

Elementos Líricos

  • O amor entre Martim e Iracema que o socorre depois de atingi-lo sem querer;
  • O sofrimento de Iracema que abandona sua tribo e seus costumes para seguir o homem que ama;
  • O sacrifício de Iracema, que entrega sua vida, para a salvação do filho.

 

Elementos Épicos

  • As batalhas entre os potiguaras e os tabajaras, entre portugueses e franceses;
  • Os atos heróicos tanto de Martim quanto de Poti nas guerras.

 

Elementos Maravilhosos

  • A mitologia tabajara: Iracema detém o Segredo da Jurema;
  • A mitologia potiguara cultivada pelo velho índio, Batuirité, que vive recluso;
  • A simbologia em torno de Martim e Iracema: o encontro entre o novo e o velho mundo.

Personagens

Centrais

IRACEMA

  • A virgem dos lábios de mel é uma guerreira da tribo dos tabajaras consagrada ao deus Tupã. Filha de Araquém, pajé da tribo, e irmã de Caubi, o melhor entre os caçadores, é a detentora do segredo da jurema, uma espécie de elixir mágico que torna os tabajaras guerreiros invencíveis;
  • É através da ótica dela que o autor ressalta cada um dos fatos importantes da obra. No entanto, o comportamento de Iracema, que a tudo sacrifica por amor, é muito próximo das heroínas românticas, por isso o autor muda o foco e passa a ver as coisas sob a ótica do homem branco;
  • Simbolicamente, representa o índio que trai os seus princípios e sua cultura atraído pelo que o homem branco lhe pode oferecer;
  • Representa o novo mundo, que tem que morrer para que surja a América, fruto da união do índio com o branco, porém adepta da cultura e dos valores dos homens brancos.

MARTIM

  • Martim Soares Moreno, personagem histórico, foi o responsável pela colonização do Ceará, em 1603.
  • Amigo dos Potiguaras ou Pitiguaras é automaticamente inimigo dos tabajaras. É amigo de Poti, chefe guerreiro, com quem divide as glórias das batalhas;
  • O guerreiro português recebe alguns apelidos: gavião branco para Batuirité, avô de Poti, e Coatiabo, guerreiro pintado, para Iracema; 
  • Deixou uma certa moça em Portugal da qual sente saudades, contudo acaba atraído por Iracema, pela sua beleza, frescor e sua capacidade de renúncia;
  • Representa o velho mundo, o dominador, que vai impor os seus princípios ao mundo novo.

Secundários

ARAQUÉM

  • É o pajé da tribo tabajara, pai de Iracema. Chefe espiritual, defende a idéia de que a jurema não deve ser dada ao guerreiro branco, amigo dos potiguaras.

CAUBI (o senhor dos caminhos)

  • Irmão de Iracema, é o maior guerreiro e o melhor caçador da tribo. É ele que irá conduzir Iracema e Martim pela floresta para escapar da ira dos tabajaras.

IRAPUÃ (mel redondo)

 

  •  É o chefe guerreiro da tribo tabajara, apaixonado por Iracema. Ao saber que ela fugiu com Martim, faz com que os guerreiros, mesmo sem tomar a jurema, persigam-nos. É o culpado pelo massacre do qual eles serão vítimas.

MOACIR (em língua tupi, significa O FILHO DA DOR)

  • Filho de Iracema e Martim, nasce quando o pai se ausenta para lutar nas guerras com Poti e, com isso, arrefece suas saudades de Portugal e de uma certa moça que deixou lá. Iracema, obrigada a cuidar sozinha do filho, acaba enfraquecendo absurdamente e vem a falecer, não sem antes entregar o filho ao pai.
  • É o filho da dor do amor, do abandono e da solidão. Nasce fruto da morte de um mundo selvagem, pois com ele nascerá o primeiro americano, o primeiro cearense, que traz o sangue do índio, mas os valores do homem branco.

POTI (Antônio Felipe Camarão)

  • Personagem histórico, é o chefe guerreiro dos potiguaras, tribo que se associou aos portugueses. Inimigo dos tabajaras, teve o auxílio dos portugueses para destruí-los;
  • Historicamente, foi um dos líderes da resistência contra os holandeses.

JACAÚNA

  • Chefe dos Potiguaras, participa das guerras contra os tabajaras.

 

O INDIANISMO


O cavaleiro medieval era símbolo de nacionalidade na Europa, como não tivemos Idade Média nos trópicos, o índio trona-se ‘idealizadamente’ símbolo da nacionalidade brasileira. No entanto, o índio que servirá ao propósito do autor, será aquele que aceita os valores do homem branco;
Iracema trairá sua tribo, seus segredos, seus valores para seguir os princípios e valores de Martim. O filho, Moacir, terá o sangue do índio, mas será educado pelo pai em Portugal, também segundo os valores do homem branco.


O ESTILO


 

  • A obra é um longo poema em prosa, tal a beleza e a plasticidade de suas imagens, a musicalidade de seu vocabulário indianista e a sua densidade lírica;
  • O conhecimento da língua indígena é o melhor critério para a nacionalidade de literatura. Ele nos dá não só o verdadeiro estilo, como as imagens poéticas do selvagem, os modos de seu pensamento, as tendências de seu espírito, e até as menores particularidades de sua vida;
  • Alencar adota o gênero do romance, mas o faz com cuidado na construção das imagens e com a musicalidade da linguagem que levaram críticas como Machado de Assis a considerá-lo mais um “poema em prosa” do que propriamente um romance. E levaram Haroldo de Campos á afirmar que: “O maior poeta indianista (o único plenamente legível hoje ...) foi um prosador: José de Alencar”. Seguindo a trilha aberta por Augusto Meyer, que já havia observado: “Bastaria Iracema para consagrá-lo o maior criador da prosa romântica, na língua e o maior poeta indianista”.
  • Vale lembrar que Alencar valoriza o pormenor, o detalhe, através de adjetivos e associações de idéias.

Estrutura da Obra

 

Título

 

  • Iracema é um anagrama da palavra AMÉRICA. Permutando-se as letras da palavra IRACEMA chega-se a América;
  • Alencar pretendia criar uma epopéia brasileira em prosa, por isso pretendia exaltar a cultura indígena e o nascimento da América a partir da lenda do encontro entre Iracema (representante do NOVO MUNDO) e Martim (guerreiro português, representante do VELHO MUNDO);
  • Dessa relação nascerá MOACIR: o primeiro cearense, o primeiro americano.

 

Subtítulo

 

  • LENDA DO CEARÁ: Há a presença de elementos líricos (amor entre Iracema e Martim), épicos (as lutas entre tabajaras e potiguaras, entre portugueses e franceses) e maravilhosos (o segredo da Jurema – o elixir sagrado de Tupã);
  • Alencar cria a lenda do surgimento do homem americano tomando como ponto de partida sua terra natal: O Ceará. Interessante verificar que os elementos formadores da nacionalidade são o homem branco e o índio. Como Alencar era escravista, o negro não aparece como elemento formador da nossa etnia;
  • Como toda lenda, esta também passa de pai para filho, tanto que o narrador se coloca como parte integrante do texto: “uma história que me contaram nas lindas vargens em que nasci”.

Período Literário - Romantismo

 

Perspectiva Estética

O Romantismo, como escola literária, predo¬mina na Europa na primeira metade do século XIX. Seu surgimento é posterior à Revolução Francesa. Forças desencadeadas por esse mo¬vimento: liberalismo e o nacionalismo.
Passado o momento mais crítico da revolução, esses movimentos continuaram atuantes, provocando a necessidade de transfor¬mações no cenário cultural europeu e criando a base para o que seria mais tarde denominado de Movimento Romântico.
Insurgindo-se contra o espírito clássico e o racionalismo iluminista, o romântico defenderá uma revolução cultural centrada na descoberta do EU e da identidade pessoal e nacional: o pen¬samento social, o passado nacional, a cultura do povo e os sentimentos individuais.

Exaltação da Imaginação e dos Sentimentos

A mensagem fundamental dos românticos foi a de que a imaginação e a criação individuais são per¬feitamente capazes de determinar a forma e o con-teúdo de uma criação artística. Note que essa afirmação é muito importante, porque liberta os ar¬tistas de formas e padrões já concebidos e consagra¬dos, criando espaço para a manifestação daquilo que podemos chamar de imaginação individual.

A diferença entre o indivíduo e a sociedade em que vive será de extrema importância para os ro¬mânticos. Deslocados socialmente, dotados de gran¬de sensibilidade e de uma alma pura, só restará aos novos artistas uma saída: a fuga do presente para um passado idealizado ou um futuro utópico.
 

Características do Romantismo

A nova estética assumiu uma feição anticlássica, pro¬clamando a liberdade individual do artista, eximindo-o da necessidade de imitação dos modelos greco-latinos. O sentimento nacionalista fez com que lendas populares, de inspiração medieval, fossem recupe¬radas, para valorização do heroísmo e da nobreza de caráter, permitindo a construção de uma identi¬dade nacional que recuperasse a "alma do povo".
A livre expressão de sentimentos conferiu aos ro¬mânticos a alcunha de sentimentalistas e individua¬listas, associando-os à manifestação de uma imaginação intensa, permeada pela atividade notur¬na e sonhadora. Em decorrência disso, a fuga da realidade se fez presente de modo marcante nas obras literárias do período.